27.4.12

Dá-se



Dá-se a falta de sono;

Dá-se o choro sem dono;

Dá-se o suspiro incólume;

Dá-se a intermitente fome;

Dá-se o pensamento malvado;

Dá-se a chuva sem fim;

Dá-se o vento gelado;

Dá-se a solidão em mim;

Dá-se a sua pirraça;

Dá-se a senil dialética;

Dá-se a chave de casa;

Dá-se a licença poética;

Foda-se.

25.4.12

Gosto de Resto



A fuligem esparsa escapa entre os dedos
E o dia ainda dorme cantando sem som
Procuro no mar, na soleira e no vento
As cinzas que ainda se deitam no chão

Esboço um sorriso e viro silêncio
Com a calma inexata da exatidão
A noite me embala em balada de anseio
E nina a insônia com triste canção

Perscruta-me a fala e a falta de apreço
E se endorme nos braços dos sonhos sem luz
Não esquece, não dói e não faz-se segredo
O réu que em mim já não acha juiz

Do encontro funesto entre verbo e sujeito
Derradeira e travessa se  faz a acção
Sem fala, sem rima e sem aproveito
Se espalha tal qual as cinzas pelo chão

16.4.12

Agora

Infindável agora
Onde está o dia
Que nunca raiou
na minha agonia

Onde está o pasto
Onde está o cerco
Do que resta ao rastro
do teu aconchego

Onde está a chance
Onde está o ar
Que me cabe ao antes
e depois de amar

Sendo eu sem rumo
e você sem par
Sendo o patio escuro
um secreto altar

Sem sabor nem cheiro
e sem hesitar
o meu peito cheio
se esvazia em mar

Sem mentira e gosto
Sem chorar ou rir
Sem mostrar no rosto
O que não dormi

Isenta de nada
Pesada de pena
Sou então pequena
Sou então alada,

Agora.

10.4.12

Insomnia II

O silêncio pro medo
Pro silêncio, a resposta
Pra resposta, o enredo
Pra viver, aposta
O saber e o segredo
Sem saber, sem perdão
A falta que faz o alento
Pelo sim e pelo não
Pelo dito e pelo feito
e pela abreviação
Sem um Verbo e um sujeito
para a nossa Criação
Sem afago e sem sossego
Sem largada e sem corrida
Sem legado e sem apego
Durmo fundo minha vida.